Festivais de música são hoje uma grande Disneylândia. Uns com jeito mais fanfarrão (Sziget), outros com aposta mais lúdica (Roskilde), mas todos se esforçam para oferecer ao público mais que shows. Nessa brincadeira de transformar um evento musical em parque de diversão pra gente grande, dá para passar um dia inteiro em um festival sem ver um show sequer, ocupando o tempo apenas com atividades aleatórias colocadas ali para proporcionar ~experiências~ ao público.

Foi o que aconteceu comigo no último dia de Brutal Assault, na República Tcheca. Decidi que precisava dar um descanso para os meus tímpanos, depois de compreensiva e pacientemente abrir os ouvidos para o heavy metal nos três dias anteriores, e não me faltou coisa para fazer. Apesar de de mediano em suas proporções, o festival entende que a metaleiragem (e os peixes fora d’água o/) não querem viver só de barulho. Olha só o que dá para você fazer ao longo de uma tarde e noite por lá:

1) Ver um filme

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Fotos do post: Gracielle Fonseca e Priscila Brito

O Brutal Assault tem uma sala de cinema dedicada exclusivamente a filmes de terror. Por dia, neste edição, houve em média 10 sessões entre as 9h e as 23h. A classificação “terror” parece ser bem flexível. Vi duas sessões seguidas no sábado: “The Acid House”, um filme B britânico que arrancou gargalhadas do pessoal, de tão tosco, e “Until The Light Takes Us”, documentário sobre o black metal norueguês e o envolvimento de alguns músicos do movimento na queima de igrejas naquele país no início dos anos 1990. Nada próximo do que se chamaria de terror, mas quem estava lá parecia não se importar. As duas sessões ficaram lotadas, com gente vendo os filmes de pé no cantinho da sala. Entre um filme e outro, dei até uma cochilada. Sério.

2) Ouvir um DJ set

Sim, tinha um DJ num festival de metal. Mas não se iluda, ele não estaria ali se não fosse para tocar nada além de metal. O interessante foi que os convidados criaram sets temáticos e engraçadinhos para orientar a rave headbanger. Eu, por exemplo, ouvi os sets “No Metal Swetness” e “Darkness is Definiton”. Heavy metal também é conceito, bem! A graça foi armada em um espaço chamado Party Village, um lounge de patrocinador com luzes coloridas, bar, pufes e esportes ~radicais~ de todas as eras, desde um mini bungee jump a cabo de guerra.

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3) Ver uma exposição de arte

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Dois artistas expuseram seus trabalhos em uma galeria improvisada na parte interna do forte militar onde acontece o Brutal Assault: o tcheco Godothor e o alemão Axel Hermman. Ambos trabalham com temáticas afins ao universo do heavy metal. Dava até pra começar a bancar o marchand: alguns dos quadros estavam à venda.

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4) Visitar um ponto turístico

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Como disse acima, o Brutal Assault ocorre em um belo forte militar, o Josefov, construído no século XVIII para proteger a Boêmia das invasões da Prússia. Na verdade, o forte é um gigantesco complexo de defesa com áreas reservadas exclusivamente para o turismo.

Como a visita toma um tempo e é preciso se deslocar um pouquinho da área do festival, passear pela própria área do festival já oferece uma amostra do que o lugar é. Bares, a exposição e a sala de cinema que eu citei acima e outras atrações do festival são montadas nas estruturas internas do forte. Basta um rolezinho de leve pra se sentir uma guerreira do exército boêmio. OH WAIT, será que eles aceitavam mulheres naquela época?

5) Tomar chá

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Por que não? Por que só cerveja? Deve ser o que a organização do Brutal Assault pensou ao incluir duas Čajovna (casas de chá) dentre as variadas opções de alimentação do festival. Inclusive, elas estão devidamente sinalizadas no mapa do evento, assim como os bares, restaurantes, banheiros e outros serviços.

O ato de tomar chá na República Tcheca não é um hábito culturalmente arraigado ao longo de séculos, como na Inglaterra ou na China – as fontes indicam que a bebida começou a ser consumida pra valer por lá em fins do século XIX. Mas é natural o suficiente para existirem casas de chá espalhadas por Praga, que tem até uma rede especializada na bebida, a Dobra Čajovna, que tem quase 20 lojas na cidade.

Dentro do bunker transformado em tea house, o ritual do chá era levado bem a sério. Uma espécie de sommelier me perguntou de que tipo de chá eu gostava. Disse que tinha preferência pelo chá verde e ele me sugeriu o Oolong, um chá chinês que pode variar de aroma e sabor conforme o grau de oxidação das folhas. Ele me ofereceu uma variedade mais caramelizada, que foi preparada e servida em uma tigela de porcelana chamada chawan.

E foi assim, curtindo um chá e outras coisas boas da vida, enquanto o barulho rolava bem alto lá fora, que eu encerrei minha visita a um festival de heavy metal. Quem diria?

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