Acho que nem de leiga posso ser chamada quando o assunto é jazz. sinto um prazer enorme em ouvir e tenho minhas referencias básicas, mas não consigo ultrapassar o limite da admiração para interpretação. Foi com esse espírito que entrei no Auditório Stravinski para ver Herbie Hancock e Wayne Shorter no Festival de Montreux.

A dupla não estava nos meus planos, assim como não estava Damon Albarn. Fui até a Suíça atraída pela programação gratuita do festival, mas a minha obsessão descontrolada por shows e ingressos me fez comprar no impulso entradas para ver Damon e Herbie + Wayne. Se eu estava em um festival que carrega jazz no nome, porque ignoraria o concerto de dois dos principais e mais históricos nomes do gênero?

Pronta para admirar a dupla, que foi apresentada por Quincy Jones, o que presenciei em Montreux foi uma conversa muito íntima de dois caras que a essa altura da vida já devem ler a mente um do outro – Herbie e Wayne integraram o segundo grande quinteto de Miles Davis, nos anos 1960. Sem trocar uma única palavra, os dois conversaram com olhares e notas musicais apenas. Foi uma conversa em sua maior parte de cumplicidade, mas também de um delicioso tom de humor em vários momentos: alternando-se entre o piano, o teclado sintetizador e o computador, Herbie provocou várias vezes Wayne, que respondia através de seu sax ora com afinco, ora com o deboche que só uma amizade permite. Em certo ponto, improvisaram algo que, na minha mente, poderia muito bem servir de trilha para um episódio de Tom & e Jerry – e eu simplesmente amei.

Surpreendente, no sentido negativo, foi ver algumas pessoas deixarem o show, pouco a pouco, à medida que os músicos finalizavam alguma música. Terminado um número, invariavelmente um pequeno grupo deixava a sala. Era como se não tivessem paciência para esperar o próximo improviso de sete minutos e se contentassem com uma fatia apenas do delicioso banquete que lhes estava sendo servido. Na média, ainda bem, o público teve comportamento na medida da elegância dos dois talentos que estavam no palco: um silêncio exemplar durante as músicas e aplausos de reverências entre elas. Ao final, em uma apresentação na qual as palavras foram desnecessárias, uma longa sequência de aplausos bastou para o público dar seu parecer sobre o bate-papo no palco. Nem meia palavra era necessária para entender e indicar que um grande espetáculo acabara de acontecer.

PS: Inexplicavelmente, a produção de Montreux não divulgou imagens da apresentação, mesmo ela tendo sido registrada em vídeo. Também não há vídeos no YouTube. Pelo visto, o público estava concentrado em contemplar a música que surgia diante de seus ouvidos 🙂

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