Se o meu eu do presente voltasse no tempo para dizer ao meu eu do passado que eu faria um intercâmbio de graça nos Estados Unidos, acharia que era uma pegadinha. Assim como muitas outras pessoas, a versão mais novinha da Priscila achava que oportunidades acadêmicas e profissionais no exterior eram caras, inacessíveis e restritas a uma certa época da vida.

Este post pede licença para os costumeiros relatos sobre festivais gringos e viagens para dizer que não, não é bem assim. Mais ainda, este post quer romper com a ideia tradicional que a gente tem de intercâmbio. Aquele em que quem tem (muito) dinheiro paga para uma agência em troca de um curso rápido no exterior só para dizer que você esteve lá. E que isso só faz sentido se você ainda é bem jovem, ainda em época de faculdade. Finalmente, é pra mostrar pra vocês que a vida não é feita só de festivais e viagens. Eu e Gra levamos o Festivalando super a sério, mas temos outros projetos também.

Experiências acadêmicas e profissionais no exterior existem aos montes. Há uma porção considerável delas que não vai te custar nada ou muito pouco. Porém, vão exigir muita qualificação e tempo para investir nos processos seletivos. Ainda dentro dessa porção, uma fatia vai ser de oportunidades que significam muito mais que algumas linhas para enfeitar seu currículo. Vão trazer muito conhecimento, networking profissional e experiências marcantes.

Uma parte delas são ótimas pra você que ainda está estudando, outras pra quem acabou de se formar, outras vão ser bem aproveitadas por quem já está há um tempo no mercado.

First things first, como diriam os estadunidenses

Neste ano eu fui para os Estados Unidos, o que rendeu algumas histórias aqui no Festivalando sobre o Governors Ball, Northside Festival, Nova York, Los Angeles e San Diego (ainda estou devendo Washington). Mas tudo isso foi resultado das “horas vagas” da viagem. A finalidade real dela foi minha participação no Professional Fellows Program, um intercâmbio financiado pelo Departamento de Estado dos Unidos, voltado para jovens profissionais de 25 a 40 anos de países em desenvolvimento.

Esse programa, especificamente, atende gente de diversas áreas de formação e espalha essas pessoas por todo o país, conforme sua bagagem profissional. Para isso, conta com o suporte de organizações profissionais que fazem a seleção e alocação dos participantes. Como sou jornalista, fui selecionada após me inscrever no processo conduzido pelo International Center For Journalists. Havia professorxs, advogadxs, engenheirxs, etc e cada um teve como mediadora uma organização da sua área profissional.

Com os meus amigos jornalistas/intercambistas do Brasil, Guatemala, Colômbia, Honduras e Nicarágua na sede do Washington Post. Foto: Rudy Girón

A experiência

Eu passei dois meses entre Washington, Los Angeles e San Diego participando do que os americanos chamam de fellowship, uma espécie de programa de desenvolvimento profissional. Participei de workshops, congressos e trabalhei em duas empresas de mídia digital na Califórnia. Todas as despesas foram pagas pelo Departamento de Estado – passagem aérea, acomodação, seguro, transporte, alimentação.

Durante o fellowship, pude ter uma visão de processos e soluções para os negócios do jornalismo bastante atualizada e muito privilegiada. Fiz conexões profissionais que me renderam trabalhos depois do meu retorno para o Brasil.

Tive treinamento em tópicos como liderança, empreendedorismo e impacto social. Conheci gente de todos os cantos do mundo, fiz amizades, participei de eventos com gente do governo dos Estados Unidos. Já aqui no Brasil, tive que entregar um projeto prático que aplica muito do que aprendi lá e que está me abrindo novas perspectivas profissionais.

Uma oportunidade e tanto. Quem diria que o conceito de intercâmbio poderia ir tão além, não é? Quem diria que há oportunidades como essa especialmente voltadas para gente do Brasil e de outros países em desenvolvimento.

Com diplominha e tudo na sede do Departamento de Estado. Foto: Rudy Girón

Intercâmbio de graça nos Estados Unidos e outras oportunidades no exterior: as dicas básicas

São vários os programas que oferecem bolsas de estudo ou de aperfeiçoamento profissional, de curta ou longa duração, em países e instituições prestigiadas, sem que você precise ter dinheiro para conseguir ter acesso a elas.

Não é a coisa mais simples conseguir – a concorrência é grande, os processos são cansativos, é preciso estar bem informadx e filtrar bem. Mas talvez pode ser mais fácil e acessível do que juntar 15 mil reais para pagar uma agência por um curso de inglês de três semanas na Flórida. Para ter a chance de conseguir uma experiência dessas, três coisas são importantes:

1. Focar no aperfeiçoamento do seu inglês

Esse é o pré-requisito quase universal para ingressar nesses processos seletivos em várias partes do mundo por motivos óbvios. Para começar, as informações oficiais que você vai encontrar sobre as oportunidades estarão em inglês. Eventualmente, pode ser que a exigência seja o idioma local que não o inglês, mas na maioria esmagadora é requirido de estrangeiros o inglês mesmo.

Em alguns casos, pode ser que não te peçam nenhuma comprovação no ato de inscrição, mas isso será avaliado em algum ponto. Por exemplo, não tive que mandar nenhuma prova da minha proficiência na inscrição para o fellowship. Mas a etapa final foi uma entrevista por Skype em inglês cuja finalidade, dentre outras coisas, era verificar se eu sabia me comunicar no idioma. Em outros, pode ser que te peçam certificados internacionais, como IELTS, TOEFL, então é bom se preparar para obtê-los e ter esses documentos sempre à mão.

pinkomelet via Shutterstock

It’s complicated

Ter acesso a aulas de inglês de qualidade no Brasil ainda é um privilégio, pois sabemos como é a situação do ensino público (eu estudei a vida inteira em escola pública) e como são caras as mensalidades dos cursos de inglês, acessíveis a uma parcela da população apenas.

Eu só fui estudar inglês de verdade quando entrei na UFMG e pude pagar o curso oferecido pelo Centro Acadêmico de Ciências Sociais (CACS), oferecido a um custo super baixo e com alta qualidade. Antes disso, me virava aprendendo sozinha pelos programas legendados da MTV e pelos encartes de CDs. Era o que tinha. Até que eu aprendi um bocado nessa época, porque eliminei um ano inteiro de curso quando fiz o teste de nivelamento no CACS. Mas o ideal seria mesmo que as “aulas” de inglês que eu tive desde a 6ª série no colégio estadual tivessem de fato me dado proficiência, sem que eu precisasse pagar anos depois para aprender de verdade…

2. Informar-se muito, muito mesmo sobre todas as oportunidades

Quando a gente descobre todos os canais que informam sobre esse tipo de oportunidade no exterior com bolsas e despesas cobertas, fica até perdidx e meio desesperadx. É que tem muita, muita coisa!

Há oportunidades para estudantes, recém-formados, jovens profissionais. Bolsas de curta e longa duração. Experiências profissionais, acadêmicas e de cunho social. Nem todas vão te interessar, nem todas vão ser adequadas para a sua idade/formação/qualificações, mas ainda assim vão sobrar muitos processos seletivos para você se candidatar.

A questão é descobrir onde ficar sabendo sobre essas oportunidades e saber filtrar as que são mais adequadas para os seus propósitos. Eu sugiro você acompanhar o seguinte:

Fontes gerais

O blog Partiu Intercâmbio e o site Estudar Fora. Eles são duas das fontes mais completas que conheço sobre o assunto. Dão um panorama ótimo sobre as oportunidades disponíveis e as manhas que você precisa para ter sucesso nesses processos seletivos.

Fontes diretas

Há organizações e instituições mundialmente reconhecidas pelo trabalho direcionado a intercâmbios. A Aiesec é uma das principais. Ela oferece oportunidades de intercâmbio profissional (remunerado), voluntário (de caráter social) e empreendedor (em startups) para universitários e recém-formados.

É preciso pagar algumas taxas, mas elas são bem baixas se comparadas ao que cobram as agências de intercâmbio. Você pode entrar no site agora mesmo e se inscrever. Logo eles entram em contato e já te colocam a par sobre o processo. Somente sugiro que antes você leia o relato super honesto do Rafa, meu amigo e blogueiro do 360 Meridianos, sobre a experiência dele em dois intercâmbios pela Aiesec.

O Departamento de Estado dos Estados Unidos tem um site que reúne todas as oportunidades de intercâmbio para estrangeiros patrocinadas pelo governo.

Para quem pretende fazer um mestrado ou doutorado, o Erasmus Mundus é um dos programas mais cobiçados. Há programas em todas as áreas do conhecimento, em toda a Europa, com bolsas integrais para estrangeiros. Os recursos do financiamento são da União Europeia.

Fontes específicas

Descubra quais são os sites e organizações que trazem informações sobre a sua profissão e/ou área de atuação. Eles podem ser uma ótima fonte para estar sempre a par de oportunidades exclusivas para pessoas com a sua formação. Eu, como jornalista, acompanho, dentre outras fontes, a IJNet, rede internacional de jornalistas.

yutanna Contributor Studio via Shutterstock

3. Ter paciência para fazer os processos seletivos

Você vai encontrar oportunidades maravilhosas. Vão ter tudo o que você pediu ou sonhou na vida. Uma vaga em instituições de prestígio, a oportunidade de viver nos países mais desenvolvidos do mundo. O acesso a uma rede de profissionais exclusiva e absolutamente todas as despesas pagas.

Mas nada é tão fácil e maravilhoso assim. Os processos seletivos exigem que você reúna uma papelada. São diplomas, histórico escolar, cartas de recomendação de professores da universidade e de ex-chefes, currículo, carta de motivação com tamanho pré-estabelecido, certificados de idiomas. Documentos que não estão em inglês (ou no idioma do processo seletivo) precisam estar traduzidos.

Por isso, é preciso ter organização e capacidade para lidar com burocracia. É importante também se preparar em vários sentidos. Informar-se sempre, e o quanto antes, para estar a par de prazos e documentos requeridos e ter certeza de que você terá tudo em mãos a tempo.

Nada de oba-oba!

Acima de tudo, é fundamental você realmente ter um propósito ao se candidatar a essas oportunidades. O simples fato de querer uma experiência fora e aproveitar uma oportunidade que vai pagar tudo ou quase tudo pra você não dá nem para início de conversa.

São processos muito concorridos, em alguns casos disputados por gente do mundo todo. Faz toda diferença se você tem um histórico acadêmico ou profissional alinhado com aquela oportunidade ou instituição por trás do processo seletivo, por exemplo. Ajuda também saber como deixar isso explícito na sua carta de motivação e nas cartas de recomendação.

Às vezes, nem isso pode ser suficiente. Além de paciência para fazer tudo isso, é preciso ter persistência, pois nem sempre a aprovação vem na primeira tentativa. Eu vinha cortejando uma experiência no exterior desde 2015. Só foi dar match em 2017. Continuo cobiçando outras e vou seguir persistindo.

#VideoSelfie: um papo sobre viagem, intercâmbio e festivais

Dicas longas e densas, né mores? Vale a leitura para quem realmente quer investir tempo para conseguir ter uma experiência dessas. Pra quem é da turma do vídeo e gosta de bate-papo, eu e Gra fizemos um vídeo selfie que resume boa parte do que está nesse longo texto 😉

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